Por Virgílio Souza
Uma das mais tradicionais mostras de cinema brasileiro, o Festival de Brasília, segue apresentando até esta terça-feira (22) curtas e longas que compõem um importante recorte da produção cinematográfica do país.
Acompanhe os posts anteriores sobre o festival: I, II, III, IV.
A Outra Margem (2015), de Nathália Tereza
Centrado em Jean, um agroboy que dirige sem destino pela noite engolindo garrafas de cerveja, o filme se ergue na oposição entre a melancolia de dentro do carro e a euforia de fora dele. O protagonista observa a diversão de outros jovens pela janela, e a câmera enfatiza o externo ao colocar a solidão e o silêncio do rapaz em contraste com as luzes e o movimento das ruas. No volante, as baladas apaixonadas do programa de rádio — Como um Anjo, de Zezé di Camargo e Luciano, por exemplo — o levam até uma garota, um caso antigo. É aí que sua apatia se transforma em rispidez, como se ele resistisse ao diálogo que ela e o filme tentam impôr. Econômico em falas e gestos como seu personagem principal, A Outra Margem aposta na contemplação, mas soa apenas desarticulado, e nem os rodopios da cena final, que finalmente aproximam a dupla, conseguem contornar sua falta de pulso.
História de uma Pena (2015), de Leonardo Mouramateus
A atenção do cineasta para a criação de dinâmicas de poder e afeto dentro de espaços reduzidos se manifesta de maneira bastante clara na sala de aula, mas não somente nela. Os alunos não querem aprender poesia, o professor não parece muito entusiasmado em ensinar. Longe dali, dois estudantes fogem da aula em uma aventura adolescente e irresponsável. A câmera, que os enquadra de perto, em pares ou individualmente, é capaz de estabelecer relações instantâneas — há elementos solitários, casais apaixonados, amigos inseparáveis etc. Por isso, permite que o filme se concentre nos diálogos que partem dessa convivência, os quais tratam de questões aparentemente triviais, como beijos em baladas e romances passageiros, temas já explorados anteriormente por Mouramateus. O filme observa a escola, sai dela e depois retorna, e nesse movimento explora os interesses de uma juventude não muito interessante. O olhar, aqui, não é de julgamento, mas de simpatia, mesmo no sonoro “Foda-se” dito pelo professor para encerrar o curta.
Santoro – O Homem e sua Música (2015), de John Howard Szerman
O único grande mérito do documentário reside na relevância de seu objeto de estudo, Claudio Santoro, um dos maiores músicos eruditos da história do país. Trata-se de uma peça de homenagem e resgate de trajetória, que busca apresentar de maneira muito didática a vida e a obra do compositor e maestro. Por meio de depoimentos de especialistas, colegas e familiares, intercalados com imagens de arquivo e segmentos de concertos baseados em seus trabalhos, o longa se dedica a narrar sua biografia. Embora interessante em conteúdo, tudo acaba preso em elogios que parecem fáceis, ao menos quando dizem respeito a alguém tão fascinante. As frases feitas se repetem como se tentassem explicitar a necessidade de maior reconhecimento popular — o único que ainda falta, dada a ampla atenção crítica à versatilidade e maestria do personagem-título. Sobram citações de teor semelhante a “se ele fosse europeu, seria aclamado como os grandes”, falta cinema. Extremamente convencional e pouco entusiasmante em termos narrativos, O Homem e sua Música passa longe da vibração que, segundo o próprio filme, tornou Santoro tão grandioso.