Por Camila Vieira
A direção do italiano Yuri Ancarani é seduzida por alguns códigos de formatação de um certo padrão de cinema contemporâneo: a duração de um cinema de fluxo que se interessa mais pela ambientação que pela centralidade de seus personagens, a composição com luzes artificiais que estetizam cenas aparentemente filmadas como realistas, a montagem que intensifica a indistinção temporal dos acontecimentos. A elaboração de tais elementos facilmente coloca Atlântida em lugar muito confortável dentro da dinâmica dos festivais internacionais.
O tour de force do filme seria Daniele, um jovem de uma ilha às margens da Lagoa de Veneza, que vaga pela região com seus engenhosos barcos a motor, sem demonstrar qualquer interesse pelas demais pessoas que transitam no local. No entanto, tudo o que o personagem fala parece ser de menor importância para o que Atlântida deseja olhar: o modo como os jovens se encontram, mergulham na lagoa, fumam e se divertem com a música e com os passeios nos barchinos. O cotidiano ocioso da juventude está presente em boa parte das sequências, inclusive várias delas filmadas com o desgastado efeito flare.
Quando o longa-metragem escapa do registro espontâneo dos jovens, ele tenta se enveredar na construção de um esboço dramático para Daniele, mas a execução torna-se bastante esquemática. Um exemplo é o modo como aparece a jovem que se interessa pelo personagem e que responde sobre os questionamentos sobre seu futuro. Em uma cena no salão de beleza, ela afirma que “desistiu de sonhar”, mas, fora o discurso, não parece haver mais nada que aponte para tal certeza.
* Visto na programação da 45ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.