Desvio (Arthur Lins, 2018)

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O outro lado da ponte

Como um transeunte nas próprias memórias, Pedro, protagonista de Desvio, representa bem os caminhos possíveis e tomados por Arthur Lins, diretor do filme, como maneira de controlar analogias e simbioses. Há um limite muito claro de tempo e de como os personagens serão delineados como representações de sentimentos distintos. Ainda que tudo pareça muito controlado e polido, Desvio apresenta alguns atritos muito interessantes.

A julgar pelo primeiro ato – e atrito – do filme, quando se apresenta como uma proto-trama de superação, o que vem em seguida é um encontro frontal com o passado, um desejo de retomada de um ponto da vida e que permeia por algum tempo a narrativa. Outro atrito muito interessante criado por Desvio é mais uma sugestão de um novo filme, um slacker feito por punks, que conversam e usam drogas e criam um mundo próprio e conivente com seus desejos. Logo este filme também será abolido por Arthur Lins para mais uma sugestão de trama.

Nestes constantes encontros e descartes, o filme parece estar sempre dentro de um limite para que as emoções sugeridas estejam sempre em primeiro plano; são raros os momentos no qual a imagem ganha da palavra e curiosamente estes são os melhores momentos do filme, como por exemplo, nas cenas de shows de punk e como o olhar de Pedro dirige-se ao palco carregado de nostalgia e certo sentido de superação.

Há o senso de legado que é a chave do filme. Se Pedro representa em diversas vias o equívoco e o arrependimento, há por trás a ideia da mutação do tempo e que tudo pode ser novo e diferente. Nesta linha narrativa, Arthur Lins enfim preserva suas pontas e faz uma cartografia de sentimentos juvenis, da revolta ao sonho da vida adulta, enquanto transforma o envelhecimento em cinzas e exemplo sempre questionável. Se falamos de extremos, Pâmela, uma jovem punk é a representação ideal para o outro lado da ponte e extermina qualquer intenção moral sobre seus personagens.

Desvio, por mais controlado que seja, tem como base o fim do julgamento sobre o olhar da câmera, como se seus personagens estivessem acima da moral que a própria estabelece. Cabe a ela a observação, mais despudorada a partir do último ato e uma aproximação com o filosofia de vida de seus personagens, ou seja, um tipo de compreensão à fórceps que aniquila qualquer consideração antecipada.

Visto na 22ª Mostra de Cinema de Tiradentes

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