Festival de Brasília: Los Silencios (Beatriz Seigner, 2018)

los silencios

Interpelar o presente

Por Pedro Tavares

Um filme quimérico para promessas dolosas. Los Silencios é despudorado sobre suas intenções diretas. Apropria-se do real como suporte principal de seu comentário, um lamento sobre a ausência em múltiplos pontos, especialmente o político. Não se trata da facilidade de falar sobre escassez pela sensação, mas inclinar a câmera sobre ela.

Curiosamente corre o sério risco de associação ou mimetismo aos filmes recentes de Apichatpong Weerasethakul ou Carlos Reygadas por sua abordagem onírica, porém Los Silencios aborta a poesia concreta como forma de anotação social ou circuito da memória latina – ainda que aqui caiba a ressonância de um século de crises e exílio; os silêncios são presenças-chave, físicas, que ganham diferentes significados em suas aparições. Com esta lógica alegórica, o que o filme faz é interpelar o presente a partir do inconformismo. Um tipo não agudo, mais próximo da lamúria que da ação propriamente dita.

Portanto, partir desta dicotomia guarda a moral ao espectador: estar de costas para sua matéria-prima pode ser um ato político, ainda que a comunhão seja exterminada, a relação se dá no espaço entre eles. A superfície que permite abordagens múltiplas, ir de um polo a outro e não cumprir o que está configurado para filmes essencialmente políticos. Na mesma medida em que se está na utopia, também estaremos na mais desgarrada realidade. É um filme ciente de sua pré-existência em outras mãos. O reorganizar por Beatriz Seigner é pela fábula, mesmo que seja o conto que explicará o pesar para todo um povo – aqui representado por uma criança.

Ainda que os problemas de articulação sejam evidentes neste espaço provocativo e que por vezes esteja interessado mais na ambiguidade nítida deste mundo recriado – quando as interferências dão muito mais resultados -, Los Silencios reforça a ideia de mundo em decadência. Feito para seguirmos obedientemente suas associações e correlações como forma de recapitulação geral: a fábula da agonia e a visualização de desejos que invariavelmente serão frustrados, afinal, se cabe o século passado neste filme, logo estaremos diante de mais um desencanto.

Visto no 51º Festival de Brasília

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