Wheel of Time, documentário das cerimônias de iniciação budista em Bodh Gaya, na Índia, revela muito das vontades e motivações de Herzog diante de um projeto, ou o que o faz perseguir a realização de um. O ritual consiste basicamente em milhões de pessoas em peregrinação (algumas de joelhos, algumas se arrastando) para ver a “Roda do Tempo”, uma mandala feita de areia colorida por monges tibetanos. Não há, é claro, sentido na busca que não o de acalmar a velha inquietação humana diante ao que não conhece ou compreende, pois quanto falta o conhecimento e a compreensão, resta a fé, que é tudo e nada ao mesmo tempo. Herzog poderia muito bem fazer ficção do quintal de casa, mas a noção de câmera traz, para ele, uma ideia intrínseca de artefato desbravador, de compor iluminuras nos rodapés do mundo. O plano final, remontando a Fata Morgana, é senha do transtorno que mantém este arqueólogo na estrada, porque há mais mágica escondida no universo do que somos capazes de registrar. A fé em sua câmera, seu cajado, o leva de um ponto a outro da Terra na esperança de encontrar também lá uma nova roda do tempo. Algum evento breve e excepcional (Lições das Trevas, La Soufrière, O Diamante Branco) que deva ser colhido na palma da mão e guardado em um relicário.