Desvío de Noche. (Paul Chotel e Ariane Falardeau St-Amour)

Visto no Festival Olhar de Cinema 2023

Por Georgiane Abreu

O encontro dos diretores com a vila mexicana de Zipolite promove a abertura de uma espécie de portal para a cosmologia daquele povo e suas histórias, muitas vezes particulares e noutras vezes a repetição de contos sobre o amor, a saudade e o surgimento do universo. 

Entre o nascimento e o desaparecimento de pessoas e estrelas cadentes, Zipolite e seus moradores – entre eles a patinadora Violeta Martinez –  surgem a partir de suas histórias como ponto de partida para as investigações dos diretores sobre luz e escuridão, superexposição e camuflagem, assim como o eclipse que dizem ser o mito fundador daquela vila, formada a partir do ajuntamento de pessoas que foram até ali para apreciar o fenômeno natural, a caracterizado pela gradativa escuridão.

Inicialmente utilizando procedimentos documentais, o filme parece partir de uma etnografia que, por falta de subsídios baseados na escala do real, segue naturalmente o detour da ficção, avolumando-se nesse sentido, criando camadas e mais camadas de histórias, que vão a cada vez retornando ao ponto inicial, como a serpente do tempo cíclico. Experimentando imagens de caráter pictórico,  aproximando o céu do eclipse e das estrelas com o chão da vila e suas pedras iluminadas pela luz da lua, o segundo momento do filme, que desvia para a noite, como sugere o título, é o que guarda suas melhores performances .

Momentos em que o descontrole é a medida e a ficção toma conta de tudo ao ponto de estarmos diante de uma narrativa sobre o surgimento do universo e suas primeiras personagens, ainda perdidas num tempo sem antes e nem depois. Assim como a personagem de Tilda Swinton em Memória, de Apichatpong Weerasethakul, parece ser uma caçadora de histórias cuja sensibilidade a faz mergulhar de cabeça no universo das personagens que encontra até o ponto de borrar os limites da temporalidade, os diretores de Desvío de Noche se deixam levar pelas possibilidades que encontram nas histórias que lhes são contadas, extraindo delas as rupturas, jogando assim com a matéria tempo como só o cinema é capaz.

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