Mostra Internacional de Cinema de São Paulo: Suor

Por Camila Vieira

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A sequência inicial de Suor (Sweat, 2020) é a tautologia do privilégio de uma digital influencer. Em um shopping mall, Sylwia Zajark uma mulher branca, loira, magra e bela faz uma demonstração de uma aula de fitness para seu público branco que deseja ser como aquela mulher. Depois dos gritos motivacionais e selfies com sua audiência, ela respira fundo e prossegue sua jornada, ao som de “She’s got the look”, de Roxette. Ela ainda tem muito trabalho a cumprir: fazer uma live para mostrar entusiasmada que sempre usa a escada no lugar do elevador de seu prédio, apresentar um shake do Olympus Nutrition para compensar a insatisfação do patrocinador e se encontrar com seu agente que está tentando agendar sua aparição em um programa de televisão.

O diretor sueco Magnus von Horn quer mostrar com Suor que a vida de uma digital influencer também pode ser muito difícil. Longe da câmera do celular, ela não escolheu estar solteira e se sente muito triste, da mesma forma como comentou sobre tal sensação em um vídeo postado em suas redes sociais. O desabafo espontâneo imediatamente viralizou e seus patrocinadores começam a ficar preocupados com a exposição indevida de tristeza da jovem.

A partir desse deslize da personagem em meio a sua rotina de construção idealizada da imagem do bem-estar, Suor vai desvelando outras informações sobre Sylwia para que o espectador tente ser empático com suas lágrimas. A única companhia dela é seu cachorrinho Jackson. A mãe parece ser ausente e fazer pouco caso das conquistas da filha. Um stalker aparece em frente ao prédio para perturbar sua tranquilidade.

É curioso como inclusive uma cena em que a protagonista reclama ter recebido uma embalagem em caixas plásticas – para deixar claro na condução da trama que se trata da rotina de uma influencer ecologicamente responsável e que devemos nos compadecer dela. No entanto, a mesma nem questiona uma empresa grande, como a Fiat, que há bem pouco tempo foi denunciada por fabricar automóveis adulterados para burlar possíveis testes de emissões de poluentes.

O único momento em que há alguma ironia a explicitar o quanto esse jogo com o neoliberalismo deve ser realmente questionado é a sequência do aniversário da mãe de Sylwia. Ao ver a imagem da moça estampada na capa da revista Women’s Health, um dos convidados exclama: “Você parece uma estátua!” – ao que ela responde com um “obrigada” constrangedor. O outro pergunta se foi usado photoshop, ao que se sucede com a queda inesperada de um jarro de flores da mesa. Mas é apenas uma sequência de desarranjo que passa ligeiro, tanto quanto uma madrugada de abusos e violências que é administrada rapidamente pela personagem. Afinal de contas, ela precisa continuar sorrindo para seus 600 mil seguidores.

Visto na 44a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo

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