Por Pedro Tavares
A CASA LOBO (La Casa Lobo) de Cristóbal Leon e Joaquín Cociña
Nos moldes de Jiri Barta, Leon e Cociña fazem uma aventura surrealista e soturna sobre o pesadelo materno. Muito mais dependente de seus vislumbres imagéticos e as possibilidades que o stop motion cria para este mundo que apoiado numa narrativa de fato, A Casa Lobo impressiona em seus primeiros minutos, o que vem depois é um ciclo de tentativas de renovação deste primeiro impacto, sem tanto sucesso.
A FLORICUTURA (La Fleurière) de Ruben Desiere
Um diálogo muito simples entre campo e extracampo como metáfora entre política e sociedade. O muro que separa ambos é o mesmo que separa o banco e um assalto. Numa floricultura presos a um plano de roubo, homens discutem a sociedade enquanto cavam o buraco para tal ação subversiva – antes mesmo de um ato de pura ilicitude em um mundo capitalista. Da imigração às guerras, estes homens, enquanto esperam se transformam no que falam.
HOMENS QUE JOGAM (Playing Men) de Matjaz Ivanisin
Coreografia da irracionalidade. Estudo do inquestionável comportamento bárbaro de homens em jogos e esportes com a distância necessária como comentário bem humorado sobre o que se exibe e principalmente a construção de uma simples questão: e se esta energia estivesse canalizada para outros fins?
SOL ALEGRIA (idem) de Tavinho Teixeira
Alegorias do subdesenvolvimento ou a grande chanchada europeia. Repleto de referências e ilustrações, Sol Alegria funciona quando é um teatro libertino sobre o Brasil e inexiste quando se aproxima de uma pureza visual ao dialogar com a função da imagem.
LA PELÍCULA INFINITA (idem) de Leandro Listorti
Eulogia do cinema argentino em uma colagem de trechos e supostas inovações visuais. Em 50 minutos de filme, Listorti se perde na repetição e o filme se resume ao experimento e não ao que deseja expor. Em muitos casos o processo é mais interessante que seu resultado, o que não é o caso aqui.
VOCÊ JÁ PENSOU EM QUEM ATIROU? (Did You Wonder Who Fired the Gun?) de Travis Wilkerson
Wilkerson e o senso de culpa e justiça americana numa confissão familiar que a todo o momento resvala no extracampo. Wilkerson é mais que um talking head invisível; ele é testemunha e diretor de um thriller policial involuntário. Um híbrido de formas e sentidos com grande força histórica.
NOSSA LOUCURA (Our Madness) de João Viana
Arquitetura e coreografia da morte – do cinema – e como a guerra impede sua ressurreição. A poesia neste caso é a salvação e o protesto em um momento crítico para a humanidade não é só para a arte e carrega uma forte dose de questionamentos sobre o racismo e a posição dos negros dentro da arte. Um filme muito pertinente para nossos tempos.
NOSSA CASA (Watashitachi no ie) de Yui Kiyohara
Espécie de conflito pessoal versus conflito-tempo num filme que nada faz além de criar um crescendo muito duvidoso sobre relações emocionais. Emula Kyioshi Kurosawa em nível rasteiro, mas a Yui Kiyohara cabe dosar a sensibilidade à narrativa.
DJON ÁFRICA (idem) de Fillipa Reis e João Miller Guerra
O grande acerto do filme de Fillipa Reis e João Miller Guerra é o de abrir mão de todas as possibilidades que o filme encontra para um drama e se fixar num road movie de códigos simples. Neles há um mundo mais propício às interpretações livres, mas ainda suportadas pelos conflitos de seu protagonista.
O VISTO E O NÃO VISTO (Seskala Niskala) de Kamila Andini
Um poema sobre o luto. A parte que se vai e a metade que fica – ambos com suas baladas à natureza. Um filme sobre irmandade e cumplicidade e o que está ao redor significa em tempos nebulosos.
A FEITICEIRA VIÚVA (Xiao gua fu cheng xian ji) de Cai Chengjie
O filme fantástico de Lav Diaz. Cabe à câmera de Chengjie a posição de grande comentarista das ações numa dicotomia lamento-ironia como um panorama social de um vilarejo repleto de humanos à margem. A figura da feiticeira é como o condutor moral – é à frente dela que este homens se ajoelham e buscam redenção, mas a questão que Chengjie sempre pauta silenciosamente é como a consciência se esvai rapidamente em um ambiente inóspito.
PARA ALÉM DE NÓS (Al di lá dell’uno) de Anna Marziano
Jonas Mekas comenta o amor. Colagens imagéticas e sonoras como forma de argumentar os tempos de caos e como o sentimento deixa de ser torrente para objeto de louvor. Uma bela nota poética, ainda que sofra com os limites impostos por Marziano que em alguns momentos esquece o norte para comentar o lado sombrio do tema.
ANSIOSA TRADUÇÃO (Nervous Translation) de Shrieen Seno
Construção de um mundo de solidão pelo olhar de uma criança na década de 80. A criação de um mundo próprio com suas obsessões e necessidades de sobrevivência é única e para filhos únicos. O filme de Shrieen Seno mais parece um espelho sobre a criatividade que faz o tempo passar e a companhia de um aparelho de rádio que um grande conflito.
MINATOMACHI (idem) de Kazuhiro Soda
Este é o sétimo filme de observação e investigação de ilhas pesqueiras japonesas de Kazuhiro Soda, mas ironicamente o filme funciona mais quando Soda justifica a presença da câmera por sua persona. Nas conversas, algo perto do que Eduardo Coutinho fez em O Fim e o Princípio, é que o diretor tira a concretude do que filma – a rotina daqueles que vivem da pesca e comércio numa vida pacata, mas que denota o fim deste estilo de vida.