PLATAMAMA (2018) – Alice Riff

por Gabriel Papaléo

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É curioso ver em Tiradentes um filme de 2018 cuja estética se aproxima do cinema observacional, depois de toda a renovação formal que filmes como A Vizinhança do Tigre e Branco Sai, Preto Fica propuseram há alguns anos, porque agora essa ideia de cinema tornou-se uma grife, uma ideia de pertencimento diante dos festivais. Parece que o formato é uma ferramenta para estruturar uma obra visando acomodá-la numa plataforma de exibição, quase como um gênero – e diante de Platamama essas intenções entram em conflito com os próprios personagens.

O retrato atento de Choco e sua família, bolivianos que vieram para trabalhar no Brasil, permanece expondo tanto o cotidiano dos retratados quanto a densidade política desse contexto; o olhar politizado de Alice Riff busca trazer as fraturas da rotina daquelas pessoas ao contextualizar desde o letreiro inicial as dissonâncias sociais presentes na vivência daquela família, teoricamente acossada no território brasileiro, mas a potência do panorama reside no processo das questões do dia-a-dia que todos ali passam por – especialmente Choco e sua mãe. Enquanto o garoto busca na música e no afeto dos amigos produtores uma expressividade em contraponto ao trabalho quem tem com a mãe, a mãe encara no trabalho apenas o meio de conseguir a sobrevivência e conforto nesse ambiente estrangeiro, e o que de fato persiste no filme é a vontade de construir um conforto de lar representativo desses personagens diante das adversidades.

É a partir da ideia de pertencimento cultural que Riff desenvolve melhor o olhar observacional, e a espontaneidade dos personagens, o que é a melhor coisa do filme. A família procura no Youtube as novelas locais e músicas em espanhol que tocam durante a narrativa, seja como foco da cena seja como pano de fundo, e falam sobre essa cultura através do microcosmo doméstico como uma forma de contato com essa casa distante. O retrato se complexifica, ainda, na figura de Choco, um jovem cujo sonho de ser rapper o aproxima de um imaginário trap gangsta oriundo dos Estados Unidos que o coloca tanto em contraste como complemento seja identificação com um ambiente que nunca está presente em corpo, mas em atmosfera e memória.

A mão do observacional de tese pesa por vezes, trazendo um clima de medo que se revela pouco eficaz em planos como os das chegadas do ônibus, em uma narrativa que sabe privilegiar pequenos momentos, mas sabe concentrar a maior parte da projeção em cenas como a no aniversário, que preocupam-se mais com uma atenção a seus personagens e a expressão deles diante do mundo, e as formas de resistência ali praticadas para existir e se sentir pertencente ao país que residem. Às vezes essa atitude é mais política que qualquer dado econômico.

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