É Tudo Verdade: Alvorada (Anna Muylaerte, Lô Politi)

me and the cult leader

Alvorada, de Anna Muylaert, junto com O processo (Maria Augusta Ramos) e Democracia em Vertigem (Petra Costa), se agregam em uma trilogia que acompanha os acontecimentos relacionados ao Impeachment de Dilma Rousseff.  Se O processo e Democracia em Vertigem se atêm a uma visão ampla, traçando panoramas e detalhes dos acontecimentos que culminaram no fatídico ano de 2016, Alvorada completa a trilogia sendo a versão contemplativa daquele momento. O filme não se preocupa em destrinchar aquilo que já foi detalhado exaustivamente, mas se põe como representante do vazio e da melancolia, em uma versão mais intimista no que se refere à atmosfera dos últimos dias da presidente no poder.

Em certo ponto do filme, Dilma afirma que nunca perdeu o equilíbrio. Pelo contrário, precisa compreender o fato de que outras pessoas o perdem em situações-limite. Em certo sentido, Alvorada também parece se imbuir da personalidade serena de Dilma, seguindo com sobriedade os seus últimos momentos como presidente. Não apenas ao lado de Dilma, mas acompanhando a rotina do Palácio junto de diversos funcionários em suas atividades cotidianas, o documentário consegue, através de seu olhar mais contemplativo que narrativo, se sustentar em formas simbólicas interessantes.

Esse simbolismo se dá justamente por meio dos funcionários e de suas funções. Além da equipe de Dilma, vemos uma série de empregados do Palácio em suas atividades ordinárias: a guarda e suas cerimônias, o processo de limpeza da piscina, a cozinha etc. Se as atividades básicas que fazem o Palácio da Alvorada funcionar continuam as mesmas, uma série de mudanças sutis ocorrem durante esse processo de mudança. A troca das cadeiras vermelhas por azuis é apenas um dos exemplos desse simbolismo que se realiza nessa dinâmica em relação aos objetos.

Assim, essa trilogia feminina acaba sendo completada pelo documentário singular de Anna Muylaert, se realizando através de uma visão mais intimista e sóbria sobre o início de um dos processos mais traumáticos da história do país. De forma silenciosa e prática, o filme consegue ter algo como uma objetividade melancólica, ainda que em diversos momentos o seu tom pareça vago e impreciso. Um filme que não se preocupa em preencher lacunas, mas sim de ser um olhar mais pessoal e específico sobre os bastidores de uma tragédia pessoal e política.

FacebookTwitter