Por Pedro Tavares
Dois caminhos distintos guiam Nardjes A. ainda que dividam semelhanças em suas abordagens: o primeiro, uma observação da personagem que batiza o filme a partir do cunho político, como a manifestação pacífica em Argel pode movimentar milhares de pessoas em prol de único objetivo. Nele, entre cânticos e gritos de protesto, um sonho de um país livre das amarras de mais um desgoverno a vir no horizonte.
O segundo e grande ponto de declínio do filme é como a câmera do celular de Karim Aïnouz também serve como dispositivo para uma espécie de vlog-manifesto. Nele acompanhamos o dia desta protagonista e sabemos que ela está numa manifestação, mas o que importa para a câmera é como um diário é construído. É na produção de interação com as pessoas, como Aïnouz escolhe um plano que favoreça a presença da protagonista no quadro e não de uma mulher que solta gritos potentes pedindo liberdade, por exemplo. E é com a câmera que Nardjes divide seus temores, ainda que Aïnouz tente deslocar sua personagem usando a voz off como saída.
O filme cresce quando Nardjes se aproxima dos seus, cantarola ou até mesmo dá foras nos homens mais interessados em outros fins por um motivo simples: a câmera não está com a protagonista como centro. Nardjes está de costas em boa parte dessas ações e o caráter de um diário vaidoso se dilui, mas estes momentos geralmente são entrecortados por este caráter modernoso do diário da menina engajada.
Quando enfim o protesto se dispersa após a construção de uma grande comoção popular, o que resta é mesmo o rosto de Nardjes, que divide suas preocupações entre os amigos e como serão suas próximas horas. Curiosamente este espaço, uma espécie de apêndice do filme, um espaço livre, é preenchido pelo anticlímax: temos o ápice do perfil autocentrado de Nardjes A., um momento que coloca em cheque todo o percurso supostamente engajado do filme. Trata-se de um povo ou de uma só face? Apesar do filme ter um nome próprio, a dúvida segue pulsante.
Visto no Olhar de Cinema