Por João Pedro Faro
Forman VS Forman parte de uma extensa reunião de arquivos que remontam a vida do diretor tcheco. O centro do longa de Helena Třěštíková e Jakub Hejna é a colagem, que liga diversas entrevistas de Milos Forman às imagens resgatadas. Nesse sentido, funciona mais como um filme-ensaio do que como um documentário em si, tendo em vista que a única voz presente é a do protagonista. Seus relatos entregam ao filme um corpo semântico que garante uma concisa condução das imagens.
A montagem é a grande força aqui. Ao recusarem típicas estéticas ultrapassadas dos documentários narrativos, como fotos em slideshow e abuso de planos de “cabeças falantes”, os diretores extraem uma experiência que nunca deixa de ser, ao mesmo tempo, informativa e cinematográfica. Até pela curta duração de 70 minutos, que resumem quase 90 anos de vida, não há sobras de tempo que não estejam devidamente recortadas e processadas. Třěštíková, veterana do ensaio documental, realiza um trabalho sucinto e direto sem que nada pareça apressado ou resumido.
Em certos aspectos, Forman VS Forman remete aos últimos trabalhos de Agnès Varda, especialmente As Praias de Agnes (2008). Claro que se trata de um trabalho bem menos grandioso (e com um personagem central muito menos carismático), mas há sim uma liberdade incondicional gerada pela revisão de toda uma carreira nas palavras de seu principal autor. Tanto no filme de Varda quanto no de Třěštíková, a aproximação entre espectador e filme só é possibilitada pela forma como concentramos a jornada na voz do centro das criações, acompanhando, na distância da lente, um artista que reconta seus passos.
O mais surpreendente é perceber como Milos Forman reconta sua trajetória como a história viva do sonho americano. De sua saída da Praga comunista pro cenário caótico dos Estados Unidos setentista, culminando em seu vergonhoso discurso em Washingnton em 89, Forman é um personagem único que guarda todos os ideais de uma geração de artistas da Europa oriental que sonharam com a “liberdade de expressão” de uma América perfeita.
O filme de Třěštíková e Hejna é feliz em respeitar a distância que Forman tinha de si mesmo e de suas próprias desilusões, com sua terra natal, sua carreira e seu novo país. Como o cineasta explica, na primeira linha do filme: “não gosto muito de pensar sobre mim”. Está aí todo o espírito do projeto. O que resta, então, para desvendar esse personagem, é revelar todos os seus passos e todas as imagens que lhe marcaram, na esperança de que exprimam alguma existência, em um confronto entre suas palavras e suas realidades. Realmente, é Forman contra Forman.