SESSÃO CURTAS PANORAMA – DIA 3

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Por Gabriel Papaléo
Verde Limão
Relato de fantasias e um histórico de resistências subjetivas e também políticas, é dos raros filmes da Mostra que conciliam sua proposta estética com um ativismo social frontal e combativo. O dispositivo das memórias da drag queen que protagoniza o filme propõe uma liberdade formal para cada memória que relembra no caminho para o que parece sua última performance. A paz com o corpo traz a paz de espírito que escapa nos cerceamentos sociais que interferem no projeto estético de cores e purpurinas, as vezes com os percalços do didatismo em um número musical, mas sem perder a honestidade e principalmente a sensibilidade do esforço de traduzir enfrentamentos em cenas e luzes.Princesa Morta do Jacuí
A armadilha da visão das memórias como ciclos intermináveis de busca e curiosidade que alcançam níveis de paranoia que sequestram o poder de escolhas nas ações é o que move essa ficção-científica especial, nos enquadramentos 4×3 do 16mm que conferem a fantasia fabular necessária as matas abandonadas desse pós-apocalipse industrial a ser visitado pelo arqueólogo protagonista. É um ambiente de pesadelo colonialista como Jauja e Zama, mas sob o filtro dos escombros, das memórias pessoais que interferem na narrativa como forma de difusão temporal, uma ilha dos desejos mais profundos como em Solaris, mas conduzida com o apego ao registro oral da narração que atravessa o curta inteiro. Estimula a criação de um mundo além das margens da imagens, sugere passados incompletos para o presente árido, e ainda deixa clara sua ideia da falência paradoxal do ato de descobrir terras – um progresso industrial enraizado na exploração colonialista que não parece ter fim.

Liberdade
Quando exatamente existe a transição de povos na convivência entre estrangeiros em um lugar comum no qual eles não pertencem por completo? O segundo plano de Liberdade já dá o tom do filme, com a senhora japonesa que habita a casa que conhecemos com o bairro ao seu fundo, meio fora de foco, presente como paisagem mas soando como uma reminiscência de casa, espaço e humana nunca conciliados propriamente. Os diferentes registros das memórias, a família japonesa em fotos 35mm preto e branco, a família guinéu-equatoriana em fotos digitais coloridas bem mais recentes – todo um imaginário de congregações exibido apenas pela nostalgia de casa.

Bup
O fluxo de consciência doido de uma artista tentando organizar seus pensamentos enquanto atua apenas com o rosto para uma câmera em close, um tanto inquisidora, que parece guardar as expectativas de um público específico mesmo que Dandara esteja nervosa diante deles – e na ótima narração em off ela desarma totalmente a pose do que poderia cair num pomposo registro de processo da atriz. Uma adaptação curiosa de Lago dos Cisnes, meio na sátira, meio na franca zoeira, que parece entender que passar num festival às vezes é atender a expectativas e lidar com elas com senso de humor, sabendo dos códigos para então subverte-los, com a personalidade inquieta da diretora e atriz que se expõe com estilo diante daquele plano único.

Mesmo com tanta Agonia
Recortes difusos de uma rotina de combates cotidianos, de lutas quase invisíveis sob a banalidade do cotidiano. Do primeiro contato com o chefe homem na cozinha quase exclusivamente de mulheres até o potente final de luzes e trânsitos, a protagonista anda em meio a lentes de longa distância e o caos da cidade de São Paulo em uma rotina de poucos eventos, passando brevemente por momentos de brutalidade corporativa no metrô e a fuga através da linda cena da festa da filha. As lutas de uma mulher negra de classe média diante das opressões tão específicas e tão enraizadas na ideia de metrópole, justificadas pelo serventilismo e o machismo, e distantes de uma resolução mas não de confrontos possíveis.

Visto na 22ª Mostra de Cinema de Tiradentes

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