MADRIGAL PARA UM POETA VIVO (2018) – Adriana Barbosa, Bruno Mello Castanho

por Gabriel Papaléo

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Logo no prólogo, Madrigal para um Poeta Vivo relaciona toda a ideia de um homem que encontra a comunhão de sua alma com a natureza, que apenas pelo andar nas pedras de um rio já denota uma intimidade com o ambiente.

Que a fuga do escritor Tico não seja naquele molde de escape da cidade mas sim um refúgio na natureza apenas como lazer momentâneo, já demonstra que o interesse daquele homem não é fugir da realidade dura que tinha no alcoolismo, morando na rua, ou estando num hospital psiquiátrico; o enfrentamento é a bandeira do escritor, sua dor não é glamurizada como ferramenta de trabalho, e ele faz questão de negar os clichês do processo de escrita – o que inclui esse retiro espiritual pra natureza como forma de clarear os pensamentos.

O filme de Adriana Barbosa e Bruno Mello Castanho é muito feliz ao retratar as visões da mídia televisiva sobre Tico, tendendo sempre ao discurso legitimador de uma ideia de mérito na jornada dupla de trabalho como coveiro e escritor, na felicidade fabricada diante das circunstâncias mais adversas do cotidiano difícil do protagonista – e é nessa sinceridade de apresentá-lo focando no processo de escrita, no encantamento do olhar dele para com o mundo, que o filme ancora sua força.

É quando procura uma personalidade imagética diante do relato que a encenação do filme se dissolve. Existe força inegável na jornada do escritor, ainda mais no caráter elegíaco da obra póstuma, mas parece que a câmera baseia toda a estrutura do filme em manter-se na superfície da sedução das palavras de Tico. Tudo é muito singelo nesse retrato carinhoso com a morte do escritor, mas as entrevistas e o tempo dilatado de inúmeras divagações anti-sistema do protagonista expõe uma montagem que esgarça a concisão do curta Ferroada, exibido em Tiradentes ano passado, e que cujo material é praticamente similar ao de Madrigal.

A dissonância vem menos do projeto ser evidentemente uma versão dilatada de Ferroada, e mais pelo olhar de Tico não ter encontrado um paralelo nas imagens que sugere. É muito menos um poema ou um madrigal, e mais um tributo – e como tal se limita quando investe na informação emocional dos depoimentos.

Visto na 21ª Mostra de Cinema de Tiradentes

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