It’s Not Me (Leos Carax, 2024)

por Carolina Azevedo 

Não é de hoje que Leos Carax se apresenta enquanto sucessor – se não imitador – de Jean-Luc Godard. Se com Mauvais Sang (1986) ele emprestou os vermelhos e azuis de Godard para fazer sua distopia romântica aos moldes de Alphaville (1965), dali em diante, percebeu seu potencial inventivo em obras de absurdo, como Holy Motors (2012) e Annette (2021). Em C’est pas moi (2024), o retorno à imitação já não cola tão bem. 

De fato, em forma, o que Carax produz é uma cópia perfeita do estilo tardio de Godard. Das Histoire(s) du cinéma (1989) e do Le livre d’image (2018), se empresta o voiceover rouco, as filmagens de seus queridos cachorros, os recortes políticos e as referências à história do cinema. Dessa memória afetuosa do grande mestre do cinema, no entanto, o que resta é um gosto amargo de quem não consegue atingir a fúria apaixonada de Godard. 

O projeto nasce como uma comissão do Centre Pompidou de Paris, que lhe pergunta: “onde você está, Leos Carax?”. O que poderia ter sido uma auto-revelação mostra um cineasta que, ao invés de sonhar – como Godard – com o futuro do cinema e da humanidade, prefere se voltar e remanescer sobre o passado. Este não é idealizado por Carax, que dedica parte do filme às lembranças dos horrores do nazismo, mas de que serve repudiar passado e presente sem sonhar com o futuro? 

O único momento em que essa reflexão – aí sim, godardiana – eleva o filme ao patamar que Carax se propõe a atingir é quando a narração do diretor nos lembra de piscar, fechar os olhos, suspender as imagens, para que possamos, enfim, continuar a ver as coisas belas. A passagem, por mais bela que pareça na sala do cinema, é como o resto do filme: não abre espaço para o espectador, dá todas as respostas e passa para o próximo tópico sem movimentar paixões. 

Conhecendo a obra de Carax, talvez seu desejo não tenha sido uma grande obra, mas uma pequena sátira, a diversão de brincar de Deus ao imitar, plano por plano, a forma de seu mestre do cinema. Pelo menos pudemos revisitar personagens emblemáticos de sua obra em novos formatos. Sr. Merda e Annette nos lembram que, em Carax, tudo é um pouco mais artificial.  

VISTO NA 48a MOSTRA INTERNACIONAL DE CINEMA DE SÃO PAULO

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